MANAUS – Após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Celso de Mello, autorizar a divulgação do vídeo da reunião ministerial, realizada no último dia 22 de abril, a privatização do Banco do Brasil (BB) retornou à pauta. Defendido com veemência pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, o assunto gera discussão na sociedade, principalmente pelo importante papel da estatal brasileira em setores como a agricultura e pecuária.
Na ocasião, Paulo Guedes declarou, em conversa com o presidente Jair Bolsonaro e o presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, ser a favor da privatização da estatal visto que, segundo o ministro, a empresa não atende aos interesses do Governo Federal, principalmente por ser preso aos acionistas minoritários.
“Tem que vender logo. O Banco do Brasil não é tatu nem cobra, porque ele não é privado, nem público. Se for apertar o Rubem, coitado. Ele é super liberal, mas se apertar ele e falar: ‘Bota o juro baixo’, ele: ‘Não posso, senão a turma, os privados, meus minoritários, me apertam’. Aí se falar assim: “bota o juro alto” ele: ‘não posso, porque senão o governo me aperta’. O Banco do Brasil é um caso pronto de privatização”, afirmou o ministro.
Com mais de 200 anos desde sua primeira fundação, ocorrida em 1808 pelo então rei de Portugal e do Brasil, Dom João VI, o BB é uma instituição constituída na forma de sociedade de economia mista, sendo 50% das participações nas mãos do Governo Federal.
Não vejo razões para privatização”, diz ex-superintendente da Suframa
À REVISTA CENARIUM, o ex-superintendente da Suframa, Thomaz Nogueira, afirmou que a atividade econômica deve ser prioritariamente privada, mas há setores e atividades em que a presença direta do Estado pode ser positiva.
“O Banco do Brasil é uma ferramenta na mão do poder público com múltiplas utilidades. Exerce um papel social, sem comprometer seu resultado operacional, continua dando lucro”, afirmou Nogueira.
O ex-superintendente explicou que a perda mais importante com a privatização do banco será em financiamentos na atividade agrícola que, provavelmente, não serão mantidos por bancos privados.
“O Banco do Brasil financia o setor mais dinâmico da economia brasileira, agrícola, com taxas de juros infinitamente menores que o setor privado. Isso, certamente, não será mantido por uma empresa privada. Por outro lado, sua presença no mercado pode parametrizar, balizar, oferecer alternativas no mercado de crédito em geral”, disse.
Outro aspecto social mencionado por Thomaz é a presença pioneira do BB em locais onde um banco privado não tem interesse imediato, mas o Banco do Brasil o faz como estimulador do desenvolvimento econômico.
“Portanto, não vejo razões para a privatização. Parafraseando aquele político, diria que “Privatismo é doença infantil de alguns no capitalismo”.
Questionado sobre a preocupação de milhares de brasileiros que têm aplicações no Banco e temem em perdas de capital, Nogueira disse que para esses clientes, pouca coisa irá mudar.
“Não. Quem perde é a economia brasileira como um todo. Privatizado, deverá concorrer no mercado igual a qualquer outro banco. Provavelmente, será vinculado à um banco estrangeiro. Para cl
ientes muda pouco. O papel institucional na oferta de crédito barato para os agentes econômicos é o que é fundamental e será perdido”.
O presidente da Comissão de Agricultura, Pecuária, Pesca, Aquicultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural da Assembleia Legislativa do Amazonas, deputado Augusto Ferraz (DEM), formado em administração, disse ser contra a privação do Banco do Brasil por entender que a instituição “não pode ficar nas mãos de pessoas que não tenham compromisso com o povo”.
“É uma temeridade imaginar isso, mas espero que não aconteça. Agora, para manter como uma economia mista, do jeito que é hoje, é necessário que esteja sempre buscando melhorias nos serviços, e principalmente na mão-de-obra dos colaboradores”, defendeu.
Mais de 200 anos de fundação
Ao lado da Caixa Econômica Federal (CEF), o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDS), o Banco da Amazônia e o Banco do Nordeste, o Banco do Brasil é um dos cinco bancos estatais brasileiros.
Para o deputado estadual Serafim Côrrea (PSB), a solução para o BB não é a privatização, mas uma modernização no sistema. Fora isso, o parlamentar acredita existir empresas de outros setores que poderiam ser privatizadas antes.
“Sou contra. O Banco do Brasil deve ser modernizado, racionalizado e virtualizado exatamente para buscar equilibrar o sistema bancário brasileiro, onde há enorme concentração e baixa competição. Acredito que cada caso é um caso”, defendeu o parlamentar.
Ainda segundo o economista, o Estado brasileiro é proprietário de empresas que não deveria ser, mas precisa continuar atuando em áreas em que sua presença é fundamental. “Energia e mineração, a meu ver deveria sair, mas não do sistema bancário”, argumentou Corrêa.
Democratização de linhas de crédito
Em um artigo divulgado pela Associação Nacional do Banco do Brasil (AABB), o economista Cézar de Medeiros enfatiza o papel social da atuação do BB. “O Banco do Brasil disponibiliza parcelas sociais com menor poder aquisitivo e essas pessoas não teriam acesso aos mesmos [como linhas de crédito para setores da agricultura e pecuária, por exemplo] junto aos bancos privados”, diz Medeiros.
Entretanto, o economista afirma que para cumprir essa função social, os bancos públicos precisam manter sua atuação sólida no mercado financeiro, sendo necessária a manutenção da robustez e integralidade institucionais.
“Bancos públicos são instrumentos estratégicos para elevar e democratizar linhas de crédito em condições adequadas de prazos e encargos tanto para a aquisição de bens duráveis, bem como para capital de giro de empresas de todos os portes. Há ainda a necessidade de condicioná-los ao controle do meio ambiente e à geração de emprego”, defende Medeiros.
Declaração de Guedes mexeu com o mercado
Não é de hoje que a privatização do Banco do Brasil é discutida no Planalto da Alvorada. No início desde ano, Rubem Novaes anunciou que a instituição planejava uma série de medidas emergenciais que seriam implantadas visando conseguir competir de igual a igual com bancos rivais privados.
A declaração ocorreu após o presidente Jair Bolsonaro descartar os planos de privatizar a estatal naquela ocasião. Durante a reunião ministerial do dia 22 de abril, Bolsonaro voltou a afirmar que essa mudança só será novamente colocada em pauta em 2023, ao fim de seu mandato, apesar do mercado se mostrar favorável.
No último dia 23, as ações do Banco do Brasil registraram uma alta de 10,49%, fechando o dia sendo negociadas a R$ 31,50, na Bovespa.
A alta seguiu até a última sexta-feira, 5, quando as ações da estatal brasileira foram comercializadas por R$35,20.
Fontes: Luana Dávila e Thiago Fernando // Revista Cenarium