
Redação – A autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para o início do derrocamento do Pedral do Lourenço, no Rio Tocantins, no Pará, acendeu um alerta entre ambientalistas, movimentos sociais e o Ministério Público Federal (MPF). Considerada fundamental para a consolidação da hidrovia Araguaia-Tocantins, a obra é também vista como uma ameaça direta ao meio ambiente e às populações ribeirinhas da região.
A licença de instalação foi assinada na segunda-feira, 26, e permite a intervenção em cerca de 40 quilômetros de formações rochosas submersas que dificultam a navegação de embarcações cargueiras no trecho entre Itupiranga e Marabá, no Sudeste do Pará. O objetivo é tornar navegável, durante todo o ano, a hidrovia de mais de 1.700 quilômetros de extensão, que liga a cidade de Peixe, no Tocantins, até Belém, no Pará.
O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), comemorou a decisão. “Depois de cerca de oito anos de espera, finalmente saiu a licença ambiental para o início do derrocamento do Pedral do Lourenço. Quem é do Pará sabe o quanto esta obra é importante”, afirmou em vídeo nas redes sociais. O governador disse ainda que, nos próximos dias, deve ir a Itupiranga para assinar a ordem de serviço que marca o início efetivo das obras.
A medida também foi celebrada pelo governo federal como um passo decisivo para a integração logística entre o Centro-Oeste e o Norte do País. “É um marco histórico, uma decisão que deve trazer desenvolvimento socioeconômico para o Centro-Norte do País, além de ajudar a reduzir a emissão de gases de efeito estufa, já que o desenvolvimento de hidrovias é o principal meio para cumprir o Acordo de Paris”, afirmou o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho.
Alerta de violações e impactos
Apesar do entusiasmo oficial, a liberação da licença ambiental gerou forte reação de organizações sociais e parlamentares. O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) também a decisão em nota pública. Para o movimento, a obra compromete diretamente a subsistência de milhares de famílias ribeirinhas e indígenas, ameaçando o equilíbrio ecológico da região.
“A obra irá causar a diminuição da quantidade de peixes, contaminação da água, o desaparecimento de espécies, entre outros transtornos, sem previsão de reparação compatível com o tamanho dos danos”, diz o texto.
Segundo o MAB, os impactos não são apenas ambientais. “A obra é justificada pela necessidade de viabilizar a navegação plena no rio Tocantins para transportar commodities, pelo discurso do tal ‘progresso’, às custas da vida e do bem-estar de tantas famílias que vivem à beira do rio”, afirma o comunicado. O movimento lembra ainda que muitos dos atingidos pelo empreendimento ainda sofrem com a falta de compensações pela construção da hidrelétrica de Tucuruí, localizada a montante do trecho.
A deputada estadual Lívia Duarte (Psol) criticou duramente a autorização do Ibama. Em publicação nas redes sociais, classificou a obra como “um ataque direto ao meio ambiente e aos povos do rio Tocantins”, apontando o uso de explosivos subaquáticos em 35 quilômetros de rocha sem consulta prévia às comunidades tradicionais, conforme determina a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

“Na terra da COP30, o Ibama acaba de liberar o início das obras de derrocamento do Pedral do Lourenço, sem consulta prévia às comunidades tradicionais. Não há justiça climática com destruição dos territórios e silenciamento das populações ribeirinhas e indígenas”, escreveu a parlamentar.
MPF aponta ilegalidade
As críticas à licença também chegaram ao campo jurídico. O Ministério Público Federal (MPF) considera a autorização ilegal por descumprimento de medidas condicionantes estabelecidas pela própria licença prévia e por violar decisão judicial em vigor.
Segundo o órgão, a obra foi autorizada sem a apresentação dos estudos de desembarque pesqueiro exigidos, além de ignorar a obrigação legal de consulta livre, prévia e informada às populações tradicionais.
“A destruição de habitats naturais afetará a fauna e flora aquáticas, alterando a dinâmica do fluxo do rio e provocando mudanças na sedimentação, que podem desestabilizar margens e ecossistemas. Ignorar a realidade dos povos tradicionais que habitam a região e dependem do rio para sua subsistência é uma grave violação dos direitos humanos”, destacou o MPF em comunicado oficial.
Com informações da Agência Cenarium