Estados da Amazônia falham em consultar comunidades sobre créditos de carbono

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Foto: Fernando Frazão

Redação – MANAUS (AM) – Um levantamento conduzido pelo projeto Fiscais do Clima, da organização Fiquem Sabendo, entre março e maio de 2025, aponta lacunas na documentação de processos de consulta prévia a povos indígenas e comunidades tradicionais e na sistematização de projetos de créditos de carbono nos Estados das regiões Norte e Nordeste – incluindo Estados da Amazônia Legal.

Segundo o relatório “O dever de documentar”, apenas seis Estados – Amapá, Alagoas, Pernambuco, Ceará, Tocantins e Paraíba – forneceram alguma lista ou exemplo de processos com consulta prévia, enquanto a maioria dos demais declarou não dispor da informação ou direcionou demandas à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e ao Instituto Nacional da Colonização e Reforma Agrária (Incra).

No Amapá, o relatório registra quatro consultas nos últimos cinco anos. A secretaria estadual (Sema) relacionou procedimentos de licenciamento em que houve “consulta pública por meio de audiência”, citando empresas e empreendimentos, como São Manoel Agrícola (Itaubal), Porto Grande Mineração (Porto Grande), Plataforma Logística do Amapá (Santana) e CL RJ 017 Empreendimentos e Participações S.A (Santana).

Reprodução/Agência Amapá

O documento observa que, na resposta do Estado, houve confusão entre audiências públicas e consulta prévia, distinção que o relatório ressalta ser relevante porque audiências públicas não equivalem ao procedimento de consulta prévia previsto na Convenção 169 da OIT.

O Amazonas informou que não seria possível fornecer as comunicações enviadas a órgãos federais nos casos que afetaram comunidades tradicionais e chegou a afirmar a existência, em sua visão, de um “vazio normativo” sobre a consulta prévia. O Estado declarou estar em processo de elaboração de diretrizes sobre o procedimento iniciado em 2024. O relatório registra essas afirmações sem quantificar processos de consulta prévia informados pelo Estado.

No Pará, o levantamento aponta que, no âmbito do Sistema Jurisdicional de REDD+ do Estado, ainda não houve comercialização de créditos, mas foi firmado um acordo de comercialização futura. Não há, segundo o documento, dados de comercialização efetiva informados pelo Estado no momento do levantamento.

Rondônia respondeu ao pedido informando que não há dados sobre consulta prévia cadastrados, mas apontou a existência de dois projetos de REDD+ em áreas públicas do Estado – identificados como Resex Rio Cautário e Resex Rio Preto Jacundá – representando, no levantamento, os projetos públicos mencionados por Rondônia.

Foto: Divulgação/PF

Roraima afirmou não possuir registros de processos de consulta prévia cadastrados e declarou desconhecimento sobre projetos privados de créditos de carbono; o Estado indicou que não há projeto governamental de REDD+ em andamento e que sua política estadual de REDD+ está em construção, sem regulamentação para registro de projetos privados.

Tocantins mencionou estudos relacionados à pavimentação da rodovia TO-010, que atravessa território indígena e afirmou acompanhar processo de consulta em diálogo com a Funai; o Estado informou também a existência de um Programa Jurisdicional de REDD+ que ainda não realizou comercialização e apontou a presença de pelo menos um projeto do mercado voluntário cujos créditos seriam descontados do programa estadual para evitar dupla contagem. Não foram apresentados, no levantamento, números consolidados de consultas prévias conduzidas pelo Estado.

O Acre, conforme a sistematização das respostas, afirmou não dispor da informação solicitada e indicou que encaminharia contato à Funai; o Maranhão não respondeu dentro do prazo ao pedido específico do levantamento. Em linhas gerais o relatório registra que, com exceção dos seis Estados que enviaram alguma lista, “todos os outros afirmaram que não dispunham da informação” ou indicaram que a competência era de órgãos federais, sem, contudo, apresentar documentos que comprovassem as comunicações aos federais.

O relatório também traz números de bases federais mencionadas no contexto das respostas estaduais: a Funai possui mais de 12,7 mil processos de licenciamento arquivados, embora, segundo o documento, sem sistematização detalhada (como nome do povo, local e descrição do projeto). O Incra dispõe de base menor, com menos de 400 processos envolvendo povos quilombolas, com informações mais completas sobre descrição do projeto, responsáveis e localização. Esses números nacionais constam no documento e são apresentados como referência ao fato de que muitos Estados remeteram demandas a esses órgãos sem manterem registros próprios.

Poucos Estados documentando
No conjunto relativo a programas estaduais e projetos de REDD+, o levantamento aponta que poucos Estados documentam iniciativas do mercado voluntário: apenas Amapá, Rondônia e Tocantins mencionaram iniciativas desse tipo em listas não exaustivas. O relatório registra que Alagoas foi o único Estado a atender ao pedido de forma completa, enviando planilha com projetos de pagamentos por serviços ambientais (pagamentos por serviços ambientais – PSA), mas que, de modo geral, há “forte ausência de registros de projetos do mercado voluntário” nos entes estaduais consultados.

O documento conclui com recomendações para que os Estados sistematizem filtros e metadados nos seus arquivos de licenciamentos ambientais, sinalizem quando houver ocorrência de consulta prévia, melhorem a gestão documental e envolvam-se na negociação e supervisão de projetos de créditos de carbono para garantir observância de legislação e direitos.

Fonte: AGÊNCIA CENARIUM

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