Cresce o nº de mulheres vítimas de homicídio no Brasil

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São 4.473 homicídios dolosos em 2017, um aumento de 6,5% em relação a 2016. Isso significa que uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil. Falta de padronização e de registros atrapalham monitoramento de feminicídios no país.

Doze mulheres são assassinadas todos os dias, em média, no Brasil. É o que mostra um levantamento feito pelo G1 considerando os dados oficiais dos estados relativos a 2017. São 4.473 homicídios dolosos, sendo 946 feminicídios, ou seja, casos de mulheres mortas em crimes de ódio motivados pela condição de gênero.

Trata-se de um aumento de 6,5% em relação a 2016, quando foram registrados 4.201 homicídios (sendo 812 feminicídios). Isso sem contar o fato de alguns estados ainda não terem fechado os dados do ano passado, o que pode aumentar ainda mais a estatística.

G1 publica nesta quarta e nesta quinta-feira um material especial sobre violência contra a mulher dentro do Monitor da Violência, uma parceria do portal com o Núcleo de Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Para Samira Bueno e Juliana Martins, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o levantamento mostra que não há o que comemorar no Dia Internacional da Mulher, nesta quinta (8). “Se considerarmos o último relatório da Organização Mundial da Saúde, o Brasil ocuparia a 7ª posição entre as nações mais violentas para as mulheres de um total de 83 países.”

O delegado Janderson Lube, titular da Delegacia Especializada em Homicídios contra a Mulher do Espírito Santo, diz que tem ocorrido mais casos de homicídios de mulheres, de uma maneira geral, por envolvimento com o tráfico de drogas. “As mulheres acabam se envolvendo no mundo das drogas e são vitimadas por tais circunstâncias.”

O levantamento revela que:

  • O Brasil teve 4.473 homicídios dolosos de mulheres em 2017 (um aumento de 6,5% em relação ao ano anterior)
  • Do total, 946 são feminicídios (dado considerado subnotificado)
  • Em 2015, 11 estados não registraram dados de feminicídios; em 2017, três ainda não tinham casos contabilizados
  • Rio Grande do Norte é o que tem o maior índice de homicídios contra mulheres: 8,4 a cada 100 mil mulheres
  • Mato Grosso é o estado com a maior taxa de feminicídio: 4,6 a cada 100 mil

Os dados expõem não apenas uma preocupante escalada na violência contra as mulheres. Eles mostram também uma patente subnotificação nos casos de feminicídio – o que os próprios estados admitem. Três anos após a sanção da Lei do Feminicídio, três estados ainda não contabilizam os números. E outros possuem apenas dados parciais.

Desde 9 de março de 2015, a legislação prevê penalidades mais graves para homicídios que se encaixam na definição de feminicídio – ou seja, que envolvam “violência doméstica e familiar e/ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher”. Os casos mais comuns desses assassinatos ocorrem por motivos como a separação.

Os dados levantados pelo G1 mostram uma lenta evolução dos registros de feminicídios no país. Em 2015, ano em que a lei foi sancionada, 16 estados registraram 492 casos. As outras unidades da federação não forneceram registros. Um ano depois, em 2016, 20 estados tiveram 812 crimes. Já em 2017, 24 estados tiveram 946 feminicídios.

“Os operadores do sistema de justiça criminal precisam olhar para a morte de mulheres e saberem quando registrá-las como feminicídios, em um processo que não é apenas técnico, mas também cultural, já que a morte de mulheres é, de certa forma, naturalizada e as violências contra a mulher no cotidiano são aceitas e reproduzidas”, dizem as pesquisadoras do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Ausência de dados

Todos os dados foram solicitados pelo G1 via Lei de Acesso à Informação. Em muitos casos, foi preciso recorrer a uma ou duas instâncias para obter uma resposta. Em outros, foi necessário acionar as assessorias de imprensa das secretarias da Segurança Pública. Mesmo assim, parte diz não possuir os números.

Alguns estados admitem que não fazem monitoramento estatístico do feminicídio por conta de “dificuldades técnicas” e “falta de transparência”. Há estados, como Rondônia, onde não há nem sequer distinção por gênero quando analisados os números de homicídios dolosos.

O Maranhão, por exemplo, apenas informa os dados de feminicídio de 2017. E justifica que, por conta da “novidade” da lei que instituiu o crime, muitos casos não foram computados como feminicídio, mas sim como homicídio, sobretudo nos primeiros anos de vigência da lei. Apenas em 2017 houve a criação de um departamento e os dados “começaram a ser computados de maneira correta”, segundo a unidade de estatística e análise criminal da Secretaria de Estado da Segurança Pública do Maranhão. Em Mato Grosso, os dados só foram obtidos com a Corregedoria do Estado.

No Distrito Federal, desde o ano passado, houve uma mudança metodológica nos registros. Toda morte de mulher já entra no sistema como feminicídio. Segundo o subsecretário de Gestão da Informação da Secretaria de Segurança Pública do DF, Marcelo Durante, cabe ao processo de investigação definir se ele será “rebaixado ou não”. “Apesar de a gente ter tido uma redução no número de mortes de mulheres, os feminicídios foram ocupando espaço maior. Isso se dá, especificamente, por conta de a Polícia Civil estar cada vez mais internalizando esses procedimentos. As instituições estão aprendendo a lidar com isso.”

Veja todos os problemas identificados nos estados:

  • Amapá: não tem dados de feminicídio de 2015 e 2016
  • Bahia: a Ouvidoria diz que não há estatísticas de feminicídio referentes a 2015 e 2016
  • Ceará: não tem dados de feminicídio de nenhum ano. A assessoria de análise estatística e criminal da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social diz que apenas no final do ano de 2017 foi implementada esta categoria de crime no Sistema de Informação Policial e que, por isso, só será possível gerar essa estatística específica a partir de 2018
  • Espírito Santo: não tem dados de feminicídio de 2015
  • Maranhão: não tem dados de feminicídio de 2015 e 2016. A Ouvidoria diz que o departamento de feminicídio foi criado apenas em 2017, ano em que os crimes começaram a ser tipificados segundo a nova legislação
  • Mato Grosso: a Ouvidoria do estado afirma que não tem dados de feminicídio para nenhum ano porque a fonte de análise são os boletins de ocorrência, e o feminicídio é apurado apenas durante a investigação ou na fase processual. Os números de feminicídio foram obtidos com a Corregedoria do estado
  • Minas Gerais: a Ouvidoria diz que os números de 2017 são parciais. A previsão é que os dados completos sejam divulgados ainda neste mês
  • Paraíba: os dados de feminicídio de 2017 se referem apenas ao primeiro semestre do ano. Os dados completos apenas serão divulgados em abril
  • Paraná: o estado diz que não foi possível elaborar a pesquisa de feminicídios do ano de 2015. Os dados passaram a ser contabilizados apenas em 2016. Segundo o governo, “o lapso temporal foi gerado em decorrência do tempo necessário para a atualização dos sistemas de registro”
  • Pernambuco: não tem os dados de feminicídio de 2015. A Ouvidoria informa que, como a lei entrou em vigor em março de 2015, os dados começaram a ser consolidados apenas em 2016
  • Rio de Janeiro: não tem dados de feminicídio de 2015. Os dados começaram a ser consolidados apenas em outubro de 2016
  • Rondônia: o governo não informa os dados de homicídio doloso contra mulheres nem de feminicídio. A assessoria diz que os crimes de homicídio doloso são registrados de forma geral, sem distinguir o gênero da vítima
  • Sergipe: não tem os dados de feminicídio de 2015 e 2016. Em 2017, só possui dados da região metropolitana de Aracaju. O governo informa que passará a ter as informações completas em 2018
  • Tocantins: os dados de homicídio doloso contra vítimas mulheres em 2016 e 2017 são parciais porque “algumas unidades policiais ainda não entregaram seus relatórios estatísticos mensais”. O governo diz que não tem dados de feminicídio especificados de nenhum dos anos

Mato Grosso é o estado com a maior taxa de feminicídio em 2017: quase 5 casos a cada 100 mil mulheres. Já o Rio Grande do Norte tem o maior índice de assassinatos de mulheres no geral (8,4). Roraima, sem casos de feminicídio registrados oficialmente pelas autoridades em 2017, tem a menor taxa do país. No caso de homicídios contra mulheres no geral, São Paulo aparece na última posição (2,2).

A Polícia Judiciária Civil de Mato Grosso diz que tem orientado suas unidades a enquadrar os casos de feminicídio aos parâmetros estabelecidos na legislação. E informa que a investigação nesses casos é célere e a autoria, praticamente certa. “As prisões vêm ocorrendo tanto no interior quanto na capital. A polícia também tem atuado no campo da prevenção, com ampliação dos programas de proteção a vítimas de viiolência doméstica”, afirma.

Além disso, a Secretaria da Segurança Pública de Mato Grosso criou um campo no Sistema de Boletim de Ocorrência Policial chamado “vínculo”, para que no ato do registro o policial coloque a informação se a vítima tem alguma ligação com o suspeito, principalmente nos casos de morte em decorrência da violência doméstica.

Procurada, a Secretaria da Segurança do Rio Grande do Norte não comenta o dado.

G1 também pediu dados de feminicídio ao Ministério da Justiça. O órgão, no entanto, não tem dados tabulados sobre o tipo de crime. Diz que “não tem os subsídios necessários para fornecer dados específicos sobre feminicídios, ficando essas informações, caso estejam disponíveis, no âmbito das secretarias de Segurança Pública de cada unidade da federação”. A ausência de uma estatística nacional mostra a necessidade de uma padronização e de um indicador mais preciso e confiável no país.

Feminicídio x homicídio

Segundo o delegado Victor Leite, da Polícia Civil de Pernambuco, o procedimento padrão de investigação para casos de morte de mulheres é, primeiro, investigar a vida pregressa da vítima para saber o que ela fazia, com quem ela andava e onde trabalhava. Dessa forma, a causa da morte é delineada e, consequentemente, é possível saber se houve feminicídio ou não.

 Fonte: G1 Amazonas
Foto:  Internet

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