A instalação de um sistema de informação (em painéis nas unidades de saúde ou pela Internet) mostrando a frequência dos médicos nas unidades hospitalares de Manaus e se eles estão disponíveis ou atrasados para o trabalho, foi elogiada pela população, que vê na novidade uma garantia de atendimento melhor, mas, ao mesmo tempo, é criticada por parte da categoria médica, que trata a medida como “discriminatória”.
A medida segue recomendação do Ministério Público do Amazonas (MP-AM), em atenção à portaria nº 1.820 do Ministério da Saúde, instituída em 13 de agosto de 2009, que trata sobre os Direitos dos Pacientes, e era uma reivindicação antiga dos ministérios públicos Federal (MPF) e Estadual. O primeiro desses painéis já funciona na capital desde outubro na área de emergência do Hospital e Pronto-Socorro (HPS) 28 de Agosto e é de fácil visualização por parte de pacientes e acompanhantes de pacientes.
Além dos painéis nos hospitais, o usuário de saúde pode acessar a frequência dos médicos pelo site da Secretaria de Estado da Saúde (Susam). Até a publicação desta matéria, ambos os canais estavam “em manutenção”. Segundo informou a Susam, como o sistema está em fase de teste, alguns ajustes estão sendo feitos, para que volte a operar, provavelmente, ainda esta semana.
Concluída a fase de testes, a intenção é ampliar para as principais unidades de saúde. O cronograma está sendo montado, divulgou a secretaria.
Nessa segunda-feira (26), no próprio HPS 28 de Agosto, usuários do sistema destacaram que a visualização da escala dos médicos é um apoio a mais para pacientes e acompanhantes nos hospitais.
“Vai ser muito bom, pois não vamos ficar à espera de um médico. Vamos saber se está presente para sermos bem atendidos. Foi uma boa implementação e o Ministério da Saúde acertou quando criou essa portaria. Eu, por exemplo, já fui prejudicada duas vezes porque o médico faltou, isso em outra unidade de saúde. Agora, vai dar para a gente se programar melhor”, disse a dona de casa Helma Costa Ribeiro, 34, que foi à unidade buscar notícias de um irmão seu que está hospitalizado com quadro estável.
Ela estava em companhia da mãe, Heleniza Costa de Oliveira, 70, que também é favorável ao controle de frequência dos profissionais da medicina. “Saber que o médico está presente nos conforta. Ruim é não saber e não ter informações sobre os nossos pacientes. Eu sei o que é a vida em hospital. A situação do País está ruim, mas se tivermos médicos bons que fazem a profissão por amor, ficará mais humano. Eu fico muito feliz quando sou bem atendida por um médico. Mas, infelizmente, alguns não olham nem para nossa ‘cara’”, disse ela.
O pedreiro Adenilson Vanderci de Souza, 52, elogiou a iniciativa. “Para mim essa medida foi ótima, pois pelo menos quando estamos internados sabemos qual médico vai nos atender e no horário que é necessário. Muitas vezes nós procuramos por um médico e não há porque faltou ao trabalho. O painel vai nos possibilitar verificar qual médico está ou não trabalhando no hospital. Isso nos dá mais segurança, e acho que isso pode fazer a diferença e melhorar bastante o atendimento”, contou ele.
“O usuário do SUS tem direito de saber”
A promotora Silvana Nobre, da 58ª Promotoria Especializada na Defesa da Saúde Pública do MP-AM, explicou que desde 2017 foram instaurados procedimentos para verificar o cumprimento da portaria.
“Até então, o Estado não vinha controlando seus prestadores de serviço. No decorrer de 2017 fomos desenvolvendo vários trabalhos no 28 de Agosto e, na semana passada ,eu havia pedido para constar dados se o médico estava na unidade hospitalar”, disse a promotora de Justiça.
“O usuário do Sistema Único de Saúde (SUS) tem direito de saber quem trabalha e qual é o médico faltante. Aguardamos que essa transparência atinja todos os níveis da sociedade, com os contratos devendo estar na Internet. O usuário é fiscal”, acrescentou.
Classe médica reclama
Integrantes da classe médica ouvidos pela reportagem do Portal A Crítica reclamaram da instalação do painel. Em nota oficial divulgada no último domingo (25), os presidentes do Conselho Regional de Medicina (Cremam), José Bernardes Sobrinho, e do Sindicato dos Médicos do Amazonas (Simeam), Mário Viana, e de outras entidades médicas, expressaram ser contrários à nova medida, afirmando que a iniciativa “transmite à sociedade a (distorcida) mensagem de que o profissional de Medicina é negligente no cumprimento de suas obrigações e criminalizando o mesmo”.
Para José Bernardes Sobrinho, a medida visa unicamente “transferir e maquear a responsabilidade da péssima saúde existente para os próprios médicos”.
“Os médicos já batem ponto pelo ponto eletrônico digital e bastaria ao gestor do hospital medir essa frequência e punir os ausentes. O que está havendo é uma discriminação com médicos, pois na realidade a culpa é de quem gere a saúde. É um modo de desviar a atenção para os problemas que estão ocorrendo no setor no Estado, que vive um caos na saúde. Não se pode generalizar, pois 95% dos médicos batem o ponto religiosamente”, afirmou.
O presidente do Cremam disse que a medida expõe a imagem dos médicos perante a opinião pública. “Por que será que só com os médicos fazem isso? Por que não fazem isso com os outros funcionários públicos? Será que só o médico é culpado? Ele é tão vítima quanto os pacientes. Faltam condições mínimas necessárias para dar um atendimento de qualidade à população. Há profissionais bons, mas falta material para fazer esse atendimento”, afirmou.
“Há pacientes morrendo nos hospitais por falta de insumos básicos na cirurgia vascular sem prótese arterial. Outros estão perdendo pernas”, completou.
Reação contra o estado
O presidente disse que o conselho vai conceder uma coletiva durante esta semana para mostrar “as condições péssimas e caóticas do hospital 28 de Agosto”. “Também vamos fazer um ‘pente fino’ nas unidades de urgência para mostrar as reais condições de hospitais como o João Lúcio e Platão Araújo”, afirmou.
‘Controle dá mais transparência’
“Esse controle social em relação à pontualidade dos médicos que estão no plantão dá mais transparência para a população, em saber que há profissionais no plantão, e que os médicos aqui do 28 de Agosto estão trabalhando desde o momento que chegam até a sua saída. O painel foi implantado em início de outubro do ano passado e, nele, a cada um minuto são passados todos os plantonistas. Aqui no 28 de Agosto ele está exposto na principal área de circulação, que é a área de emergência, onde os pacientes ficam aguardando resultados de exames e consultas. E o público externo e qualquer órgão de controle pode ter acesso à relação de plantonistas no site da Susam”, disse o diretor do HPS 28 de Agosto, Paulo Roberto Mendonça Júnior.
Fonte: Acrítica
Foto: Acrítica